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domingo, 24 de junho de 2018

MEU COMPROMISSO COM A VIDA.

                                                         
                                                              (Andrei Markin art)

Olho para o passado com lascas de nostalgia e pontas de melancolia. Caminhos que nunca trilhei hoje parecem bem mais fáceis. Amores que exigiram coragem voltam a me seduzir para me deixar ainda mais triste. Aventuras que nasceram de narcisismos e falsas onipotências reclamam explicações; como justificar tanto delírio? Não, não pretendo remontar passado. Desisto de qualquer tentativa de ressuscitar o que jaz sob o lajeado da decepção.

Para refazer meu compromisso com a vida, abandono o rigor de um humanismo idolátrico. Não idealizo as iniciativas ideológicas. Sei que toda instituição convive com o germe de sua própria inutilidade. Também não me prostro no altar do niilismo; descreio da capacidade humana de erguer-se pelos próprios cadarços. Meu existencialismo é frágil, carregado de suspeita. Minha religião, cheia de decepção. Minha ideologia agoniza debaixo dos escombros da modernidade.

Para refazer meu compromisso com a vida, largo na beira da calçada as metas-narrativas. Desconfio dos projetos globais. Incoerência entre discurso e prática me desesperam. Criei cismas. Rio por dentro; é meu jeito de sobreviver aos ufanismos que tanto me irritavam no passado. Sei que preciso aniquilar os fantasmas que me deixaram com a sensação de ser um deus.

Para refazer meu compromisso com a vida, desisto de tentar levar a ferro e a fogo qualquer coisa. Erros me fizeram bem. Boas ações me arruinaram. Amigos me entristeceram. Desconhecidos me acolheram. Quando planejei, empaquei. Por outro lado, inesperadamente a vida deu certo sem planejamento. Sofri também com erros. Paguei um alto preço por ser indolente. Mas, incrível, quando deixei para o dia seguinte o que deveria fazer hoje, foi bom.

Para refazer meu compromisso com a vida, quero ser leve como a pluma que escapou da asa do cisne, denso como o ruço que cobre a madrugada, escuro como a noite tropical sem lua, e transparente como o mar do Mediterrâneo. Hei de aprender a não discursar. Almejo ser mais enfático mas só em ternura; mais brando em afirmações. Pretendo rearrumar minha oratória. Quero voltar a olhar para o nada, como as crianças; a entrecortar frases com longas pausas, como os monges; a ritualizar os instantes, como os namorados.

Para refazer meu compromisso com a vida, espero envelhecer sem casmurrice. Acolher as doidices dos jovens, lembrando de como as minhas faziam sentido. Celebrar cada manhã como uma ressurreição. Aguardar o pôr-do-sol como uma grávida anseia pelo primeiro choro do filho. Plácido como um lago entre duas montanhas, espero encarar a morte. E que não reste nenhuma nesga de frustração em minha alma. E que eu descanse no sábado final com um sorriso maroto, sorriso de quem foi embora dizendo: valeu viver.

(Por Ricardo Gondim)


domingo, 17 de junho de 2018

É PRECISO SABER DIZER ADEUS.



Há coisas que ninguém nos ensina; há coisas que nunca queremos aprender.
Recebemos de bom ou mau grado o que a vida nos impõe e depois nos apegamos a essas coisas, pessoas ou sentimentos como se para existirmos precisássemos deles.
Dizer adeus é como deixar um pedaço de si e se impedir de olhar pra trás.
Sim... confesso que é difícil dizer adeus, aquele sem retorno, às pessoas que amamos e aceitar isso como parte natural da vida.
É amargo aceitar o adeus dos sonhos, dos que começaram e jamais foram terminados.
Mas o que é incompreensível no ser humano é a rejeição do adeus total e definitivo às feridas e magoas que consomem nossas entranhas. É a dificuldade em livrar-se do passado, das manchas da alma, do que nos impede de ter uma vida normal e possivelmente feliz.
Há pessoas que guardam tudo e saem carregando nos ombros o que recolheram da vida. Isso faz com que caminhem com passos mais lentos, faz com que nunca cheguem a um lugar definido.
Para alcançarmos libertação e cura deveríamos possuir a arte de saber deixar definitivamente para trás o que nos impede de avançar.
Quem cultiva a dor, colhe a dor; quem cultiva ódio, colhe ódio; quem cultiva ressentimentos, colhe ressentimentos.
Se nosso coração é um jardim, devemos saber o que estamos plantando nele e o que estamos arrancando. Se com lágrimas regamos o mal que nos fizeram, com lágrimas colheremos o mal que nos fazemos a nós.
É preciso aprender a dizer adeus a todas as mágoas, custe o que custar, se quisermos alcançar a misericórdia prometida, a graça eterna... se quisermos ser, nem que seja um pouquinho, parecidos com Jesus.

Letícia Thompson

domingo, 10 de junho de 2018

SEJA FELIZ POR VIVER...


                                                           (Margarita-Kareva)

Que sua presença,
seja sempre um sopro de ar puro
para o ambiente em que estiver.

Que sua pessoa seja digna de confiança,
mas com um toque de criatividade.
Disponível, mas sem esquecer-se de si.

Incansável pelo ideal,
mas satisfeita com a vida.
Ligada aos amigos,
mas capaz de pensar distante.

Não conte os anos que já viveu,
mas ame a vida simplesmente.
Ocupe-se intensamente no que faz,
sem pensar no que poderia ter feito.

E se um dia já não puder seguir
fisicamente o ritmo habitual,
descubra mil outras coisas para fazer,
outros mundos para explorar
e pessoas para amar, mantendo a paz e o entusiasmo no espírito.

Assim, muitos buscarão a sua amizade,
pela sua alegria contagiante,
pela sua inspiração que sugere,
e sobretudo pelo exemplo que proporciona
de uma vida plenamente realizada.


(msg.do livro: "100 dicas para viver melhor")


domingo, 3 de junho de 2018

NÃO EXISTE BOTOX PARA O VAZIO EXISTENCIAL.


                                             (Konstantin-razumov)
Não somos nada nem ninguém sem consumir. Você já parou para pensar nisso? Vivemos numa sociedade de consumo, disso todos nós sabemos. Acontece que a nossa ânsia por obtenção palpável se estendeu até os desejos mais íntimos. Não adquirimos por ímpeto apenas roupas, sapatos, objetos. Nós consumimos sentimento, gente, sexo, prazeres, tempo. Tudo. Parece que sem consumo não existe vida. Nem bem-estar. Nem alegria. Nem amor. Nem nada.
As pessoas estão cada vez mais insatisfeitas com elas mesmas e com o mundo. Querem preencher a qualquer custo os seus buracos. Consomem tudo e todos ao mesmo tempo, na ânsia desesperada de abarrotar os espaços vazios que levam por dentro.
Começam se enchendo de coisas, mas logo o tangível passa a não bastar. Então, encontram nos outros a possibilidade da sensação de plenitude, de prazer e satisfação. É uma perseguição efêmera atrás da saciedade.
Aí vem a primordialidade de ter e sentir, a carestia da posse, que comanda os sentidos e determina as ações. Objetos já não suprem a ausência física de uma companhia, o desamor que maltratou o coração, o desejo carnal irrefreável. É preciso sentir que alguém lhe pertence, nem que seja por algumas horas, até atingir um nível de contentamento. A ideia da posse acalma.
O problema é que depois que o refém é liberado, um rombo maior se abre por dentro, e você vai precisar preenchê-lo outra vez. E mais outra. E assim, sucessivamente. Até que uma sombra equilibre a sua e, juntos, consigam fechar todos os rasgos.
Enquanto isso não acontece a busca pelo prazer e pela companhia entra em um círculo vicioso. É preciso se sentir querida, desejada, amada, reverenciada. Se consome amizade, se consome sexo, se consome o tempo dos outros, a atenção. Aliás, o tempo é uma coisa curiosa.
Tem gente que só se sente vivo, de fato, se estiver abusando de todo e qualquer sopro de segundo. Perder tempo ou sentir que não está fazendo nada com ele é infelicidade na certa, é causa mortis. Abusam do tempo, o tempo todo, a fim de afirmar-se vivo.
E assim, o consumo se expande junto das vontades cada vez mais ansiosas e caprichosas. O eu grita mais e mais alto, faz as suas birras, é exigente. Você cede. Até porque a sensação é de que uma vida sem consumo é chata, vazia e sem nenhum propósito. O pensamento é que só é possível ser feliz quando se adquire, seja lá o que for.
As pessoas gastam dinheiro, gastam tempo, investem os seus planos e sonhos, se desgastam em expectativas e frustrações. Tudo em busca de um sentimento de verdade. Não precisa ser imenso, não, mas que seja inteiro.
A verdade é que enquanto faltar amor aqui dentro nós continuaremos procurando lá fora por alguém que nos baste. Miraremos alvos incertos, consumiremos o mundo freneticamente, expostos ao tiroteio dos corações caçadores.
A esperança é que, no meio da artilharia, em lados opostos, nos reconheceremos dentre tantos atiradores; nós e o nosso amor próprio. Só quando nos encontrarmos deixaremos de ser ávidos consumidores de gente.

(Por Karen Curi – Jornalista)


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